Domingos Rebelo |
Domingos Maria Xavier Rebelo (Ponta Delgada, 3 de Dezembro de 1891 - Lisboa, 11 de Janeiro de 1975), mais conhecido por Domingos Rebelo, foi um professor e pintor açoriano.
Os Emigrantes (1926) |
Foi autor de algumas das imagens mais emblemáticas da iconografia dos Açores, com destaque para
Os
Emigrantes, provavelmente a imagem mais reproduzida no arquipélago.
Biografia
Domingos Rebelo, filho de José Eduardo Rebelo, guarda
fiscal, e de Georgina Augusta Pereira Rebelo. De posses modestas e quatro
filhos, a família Rebelo atribuía grande importância à vida familiar e à
actividade religiosa, aspectos que seriam marcantes tanto na vida como na obra
do pintor.
A família Rebelo valorizava a educação dos filhos, e Domingos Rebelo teve a
oportunidade de fazer um percurso educativo então acessível a poucos: depois de
aprender as primeiras letras com as senhoras Pereira, na rua da Arquinha,
frequentou o Instituto Fischer, onde recebeu uma educação com uma forte
componente católica, o que veio reforçar as crenças religiosas familiares. Tendo
desde muito cedo revelado propensão para o desenho e para a pintura, ingressou
na Escola de Artes e Ofícios Velho Cabral, a antecessora institucional da actual
Escola Secundária Domingos Rebelo, cursando desenho.
O pintor Artur Jaime Viçoso May, director da
Escola, reconheceu o talento artístico do aluno e incentivou a produção das suas
primeiras obras. Foi graças a esse apoio que Domingos Rebelo, com apenas 13 anos
de idade, pela primeira vez expôs uma das suas obras, colocando um quadro seu na
montra da Loja de Duarte Pereira Cardoso, sita à rua Nova da Matriz, actual rua
António José de Almeida, no centro de Ponta Delgada.
A obra exposta e o apoio de Viçoso May levaram o talento de Domingos Rebelo à atenção dos condes de Albuquerque, os quais, impressionados com a qualidade da sua arte, se ofereceram para custear os estudos artísticos.
A descoberta de São Miguel (1940) |
Com o apoio de Duarte de Andrade Albuquerque de Bettencourt, o 1.º conde de Albuquerque, e de Viçoso May, foram criadas condições para que Domingos Rebelo pudesse prosseguir os seus estudos em Paris. Tinha 15 anos de idade quando deixou Ponta Delgada a caminho da grande metrópole europeia.
A descoberta de São Miguel (1940) |
Em 1911 participou na Exposição dos Livres no Salão Bobone, em Lisboa, ao lado de Eduardo Viana, Emmerico Nunes, Alberto Cardoso (1881-1942), Francisco Smith, Manuel Bentes e Francisco Álvares Cabral (1887-1947).
O tocador de viola da Terra (Bilhete Postal - Edição dos CTT) |
Casou com Maria do Carmo Berquó de Aguiar, natural de Ponta Delgada, que
faleceu muito cedo, sem deixar descendentes. Voltou a casar, em 1921, com Maria Josefina de Oliveira Correia, natural de Viseu, que seria a sua companheira
inseparável e de quem teve cinco filhos, um dos quais foi o arquitecto João Correia Rebelo.
Em 1913, regressou à ilha de São Miguel onde permaneceu trinta anos, deslocando-se de vez em quando a Lisboa
e participando com regularidade nas exposições anuais da Sociedade Nacional de Belas-Artes, de que era sócio e de que seria mais tarde dirigente.
A fase regionalista (1913-1942)
Pescadores de Rabo de Peixe (1937) |
Apesar da sua prolongada estada em Paris e das suas variadas deslocações a
Lisboa, Domingos Rebelo permaneceu sempre ligado aos Açores, ligação que se
acentuou depois do seu segundo matrimónio.
Fixado em Ponta Delgada, dedicou-se à docência, trabalhando na escola onde
tinha estudado, ao mesmo tempo que continuou a pintar, expondo localmente mas
mantendo uma importante presença em Lisboa, nos eventos patrocinados pela
Sociedade Nacional de Belas-Artes, com algumas participações internacionais.
A devoção que sentia pela sua terra natal está patente na grande maioria das
suas telas deste período, nas quais retratou costumes, tradições e usos do povo
açoriano, com destaque para as actividades tradicionais do mundo rural, as
alfaias, os aspectos religiosos, as festividades, música e danças. Esta
predominância de temas etnográficos marcam decisivamente a pintura de Domingos
Rebelo, a ponto de alguns críticos o apelidarem de pintor-etnógrafo.
Igreja da Sé em Angra do Heroísmo (1920) |
Ao longo das décadas de 1920 e 1930 Domingos Rebelo foi definindo a sua
personalidade como pintor, afirmando um gosto cada vez mais insular. Foi este o
período mais rico e criativo da sua vida, produzindo os seus melhores trabalhos
e revelando a sua tendência regionalista. Na altura, vivia-se nos Açores, e em
particular na ilha de São Miguel, uma complexa dinâmica social e política entre
as tendências autonomistas, com raízes na Primeira Campanha Autonómica e o (re)nascimento do nacionalismo português da fase
final da Primeira República Portuguesa e do período conturbado da transição da Ditadura Nacional para o Estado Novo. Neste contexto, a
intelectualidade açoriana sucumbe ao chamado ‘’regionalismo’’, surgido então
como uma espécie de síntese, onde sem negar a portugalidade imposta pelo
crescente nacionalismo, se exaltavam valores de açorianidade. Nesta linha surgem
obras como a de Gervásio Lima, de Armando Narciso ( e o Primeiro Congresso Açoriano) e
de Domingos Rebelo, onde repassa um quase-romantismo serôdio, exaltando os valores açorianos,
representados pelo costumes ancestrais do povo açoriano, ao mesmo tempo que se
tecem loas às lusas virtudes pátrias.
Varando o Barco (1924) |
Uma boa definição do movimento é dada por Luís Bernardo Athayde, então director do Museu Carlos Machado, que em 1921 publicou um artigo onde refere que o verdadeiro
artista regionalista é aquele que, através da sua arte, procura contribuir para
o renascimento da sua pátria e despoletar na alma portuguesa o amor pela terra
natal. O regionalismo é a valorização daquilo que é popular e único na cultura
de um povo e que se mantém vivo na alma e no quotidiano ao longo dos séculos. O
povo torna-se objecto de estudo e campo de análise.
O regionalismo não se fazia sentir apenas na literatura, mas invadia as
outras vertentes da criação intelectual, estando patente na historiografia da
época (com um culto exagerado da heroicidade açoriana ao serviço da gesta lusa),
na poesia, na música e nas artes plásticas. Assistia-se a uma influência mútua,
onde as diversas formas de criação convergiam numa complexa, e por vezes
verdadeiramente contraditória, teia de interacções.
O Jardim das Senhoras (1923) |
Bem significativa deste enquadramento intelectual é a passagem de uma carta
endereçada por Domingos Rebelo ao seu grande amigo Armando Cortes-Rodrigues, datada
de 14 de Dezembro de 1923, onde Domingos Rebelo
afirma: creio que desta vez encontrei aquilo que desejava. Depois de tantas
hesitações cheguei à conclusão de que o meu temperamento era realista e que a
minha Obra tem de ser feita aqui, Regionalista, sentida com máxima justeza.
Este sentimento explica a tendência popular regionalizante de grande parte da
pintura de Domingos Rebelo, a qual faz parte deste conjunto indissociável de
obras de todos os géneros, cuja linha comum é a procura da herança primitiva, de
cariz popular, presente nas manifestações mais relevantes do povo açoriano, como
as festividades do Espírito Santo e do Senhor Santo Cristo dos Milagres, bem como nas paisagens e nas cenas da vida rural, abundantemente
descritas e magistralmente pintadas por Domingos Rebelo.
Vacas e Fardos de Palha (1932) |
Neste contexto merece referência o quadro Os Emigrantes, justamente
considerado o ex-libris da pintura açoriana e a obra-prima de Domingos
Rebelo. Naquela composição, a viola da terra, instrumento intrinsecamente
açoriano, o registo do Senhor Santo Cristo dos Milagres e as vestes e expressões
dão uma imagem pungente da açorianidade vista pelos olhos do regionalismo. A
obra, considerada como uma referência obrigatória no panorama regionalista, é
seguramente a imagem mais vezes editada e com maior circulação de toda a
iconografia açoriana, estando presente em todo o mundo graças à diáspora
açoriana. Só esta obra basta para fazer de Domingos Rebelo o pintor açoriano
mais conhecido e representativo.
A Raposa (1905) |
Em 1920, com 28 anos de idade,
deslocou-se ao Brasil, onde foi
distinguido com a medalha de prata numa exposição efectuada no Rio de Janeiro. Alcançou
também os prémios Silva Porto (com a obra Retrato de Família de
1937), Rocha Cabral e Roque Gameiro, todos galardões criados sob a
égide da Sociedade Nacional de Belas-Artes.
Em 1922, Domingos Rebelo realizou uma
exposição individual no salão nobre do Governo Civil de Ponta Delgada, no Palácio da Conceição.
Em 1925 ganhou a medalha da Sociedade
Nacional de Belas-Artes, com um magistral retrato de Viçoso May.
Em 1937, expôs no salão de festas de O
Século, com honras de visita do Presidente da República. Nessa exposição,
Domingos Rebelo apresentou a magnífica pintura a óleo intitulada Supremo
Refúgio, uma das suas melhores composições.
Em 1939, participou numa exposição em São
Francisco da Califórnia,
com artistas de 79 países. Uma das suas obras foi adquirida pela entidade
organizadora.
Em 1940 foi nomeado director da então Escola Industrial e Comercial de Ponta Delgada (hoje Escola Secundária Domingos Rebelo), cargo que exerceu até à sua partida para
Lisboa, em finais de 1942. Nesse mesmo ano,
realizou no ginásio do Liceu Antero de Quental, de Ponta
Delgada, a sua última exposição nos Açores.
Pintor e mestre em Lisboa (1942-1975)
Infante D. Henrique (1945) Assembleia da República |
Como bolseiro do Instituto de Alta Cultura pôde
percorrer em 1950 várias cidades italianas,
visitando museus e colecções de pintura. De regresso a Lisboa, pintou os frescos
da Igreja de São João de Deus, iniciando uma fase já desligada do regionalismo, durante a qual
produziu centenas de quadros de temática diversificada que hoje se encontram
dispersos por museus, igrejas e colecções particulares.
Para além da sua actividade como pintor, manteve-se ligado à docência e foi
director da Biblioteca-Museu do Ensino Primário, instalada em Benfica, Lisboa, junto da antiga Escola do
Magistério Primário de Lisboa.
Foi director e vogal da Academia Nacional de Belas Artes entre 1947 e 1970. A partir dessa data passou a ser vogal
honorário.
Tomada de Ceuta (1945) Assembleia da República |
Fazem parte da obra do artista composições para tapeçarias que figuram no
campus da Universidade de Coimbra, bem como
miniaturas em barro de cariz etnográfico que se encontram no Museu Carlos Machado.
Domingos Rebelo manteve sempre uma postura de mestre, acarinhando os jovens
pintores açorianos em início de carreira, particularmente aqueles que se
deslocavam a Lisboa.
Domingos Rebelo faleceu em Lisboa no dia 11 de Janeiro de 1975. Foi um homem que orientou a sua vida
segundo princípios morais e religiosos muito rigorosos e através da arte
procurou a verdade e a tranquilidade da sua consciência.
Tomada de Malaca (1945) Assembleia da República |
Tendo sido aluno, professor e director da antiga Escola Industrial e
Comercial de Ponta Delgada, Domingos Rebelo foi escolhido em 1978 para patrono daquele estabelecimento, que a partir de 1 de Janeiro de 1979 se denomina Escola Secundária Domingos Rebelo, uma das maiores e mais prestigiadas escolas
secundárias dos Açores. Por feliz coincidência, as actuais instalações da Escola
situam-se na imediações do Papa-Terra, o bairro de Ponta Delgada onde o pintor
viveu e trabalhou.
In: Wikipédia
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