Descoberta e povoamento
Vista da Vila do Corvo |
Nos mapas genoveses do século XIV, nomeadamente no Portulano Mediceo Laurenziano (1351), é mencionado a "Insula Corvi
Marini" (Ilha do Corvo Marinho) entre as sete ilhas que compunham o
arquipélago, mas é improvável que esta designação se refira especificamente a
esta ilha, apesar de ter sido a origem do nome. É provável ser uma designação
para ambas as ilhas do Grupo Ocidental do Arquipélago dos Açores, como parece
ser o caso no chamado Atlas Catalão (1375).
Na fase de exploração portuguesa do Atlântico sabe-se que foi Diogo Teive quem achou
as ilhas do Grupo Ocidental dos Açores, no regresso de sua segunda viagem de
exploração à Terra Nova, em 1452. Terá sido descoberta em simultâneo com a
Ilha das Flores, já que as ilhas se avistam mutuamente. A sua designação
henriquina é Ilha de Santa Iria, mas foi também chamada de Ilhéu das Flores, ilha da
Estátua, ilha do Farol, ilha de São Tomás e ainda de Ilha
do Marco, tendo este nome persistido durante alguns séculos em razão, de
para alguns servir o monte do Caldeirão servir como uma referência geográfica
para os marinheiros ou, e mais
provavelmente, pelo facto de existir um pequeno promontório a que foi dado o
nome de Ponta do Marco, local onde possivelmente terá sido afixado algum padrão como era hábito fazer-se
nas novas terras descobertas.
Caldeirão |
A caminho do Caldeirão |
Apesar da incerteza quanto à data do achamento português da ilha, é
seguramente anterior a 20 de Janeiro de 1453, data em que Afonso V de Portugal fez doação da ilha, e da vizinha ilha das Flores, a seu tio, Afonso I, Duque de Bragança.
A primeira tentativa de povoamento do Corvo foi empreendida por um grupo de
30 pessoas, lideradas por Antão Vaz de Azevedo, natural da ilha Terceira, no início do século XVI, que entretanto culminou com o seu
abandono.
Caldeirão |
O mesmo sucedeu com um grupo de povoadores,
também oriundos da Terceira, liderados pelos irmãos Barcelos. Mais tarde, em
meados do século, a 12 de Novembro de 1548, Conçalo de Sousa, capitão donatário das ilhas
das Flores e do Corvo, foi autorizado a mandar para ilha escravos - provavelmente mulatos, oriundos da ilha de Santo Antão, arquipélago de Cabo Verde - de sua confiança como agricultores e
criadores de gado.
Em 1570 foi construída a primitiva
igreja. Por volta de 1580, colonos das
Flores fixam-se no Corvo, que, a partir de então passou a ser permanentemente
habitada, dedicando-se a população à agricultura, à pastorícia e à pesca.
Piratas e corsários
Apesar de seu isolamento, a ilha sofreu diversas incursões de corsários e piratas. Os corvinos, entretanto, souberam impor-se,
muitas vezes aliando-se aos incursores e participando activamente na sua
actividade. Em troca de protecção e dinheiro, a ilha fornecia água, alimentos e
homens, ao mesmo tempo que permitia tratar os enfermos e reparar os navios.
Em 1587, o Corvo foi saqueado e as suas
casas queimadas pelos corsários ingleses, que haviam atacado as Lajes das
Flores. No ano de 1632, a ilha sofreu duas
tentativas de desembarque de piratas da Barbária, no local do
actual cais Porto da Casa, que na altura ainda era apenas uma baía. Duzentos corvinos usaram tudo ao seu dispor
para repelir os atacantes que acabaram por desistir com baixas. A imagem de
Nossa Senhora do Rosário foi colocada na Canada da Rocha e daí, diz a lenda que
ela protegeu a população das balas disparadas.
Foi o segundo pároco da ilha, o florentino Inácio Coelho, irmão do cronista
frei Diogo das Chagas. Foi ele quem conseguiu que D. Martinho de Mascarenhas, 2.º capitão do donatário, assumisse o sustento do pároco, bem como a ele se deve a
presumível redacção e divulgação dos factos e atribuição à Virgem Maria do
milagre da vitória dos corvinos sobre os piratas. A partir de então, a imagem
passou a ser chamada de Nossa Senhora dos Milagres.
Interior da Igreja de Nossa Senhora do Rosário |
Em 1647 o lugar do Corvo foi elevado a paróquia, sendo o seu primitivo
orago Nossa Senhora do Rosário.
Antes dessa data, a ilha era visitada anualmente
por um padre de Santa Cruz das Flores por ocasião da Quaresma. O primeiro pároco foi o faialense Bartolomeu Tristão.
O século XVIII
No século XVIII, com a chegada dos barcos baleeiros norte-americanos à Ilha das Flores para recrutar tripulação e arpoadores, uma vez que os corvinos eram apreciados pela sua coragem, iniciou-se uma estreita relação com a América do Norte, que passou desde então a ser o destino de eleição para a emigração corvina e de onde chegaram praticamente todas as novidades à ilha, a qual manteve durante muito tempo uma relação mais estreita com Boston do que com Lisboa.
A
emigração clandestina era uma constante da vida da ilha, apesar dos esforços
repressivos das autoridades portuguesas, preocupadas com a fuga ao serviço
militar obrigatório e com a perda de mão-de-obra.
Os corvinos tinham de pagar tributo aos seus capitães do donatário e, a
partir de 1759, com morte a 8.º duque de Aveiro e conde de Santa Cruz, à Coroa.
Foi Mouzinho da Silveira, impressionado pela
quase escravidão em que vivia o povo do Corvo, obrigado a comer pão de junca para poder pagar o tributo a que
se encontrava obrigado, quem propôs a redução, para a metade, do pagamento em trigo e anulou o pagamento em dinheiro,
fazendo assim a felicidade dos corvinos. Manuel Tomás de Avelar foi o chefe
delegação de corvinos que foi a Angra do Heroísmo fazer a petição,
despertando, pela sua sabedoria e maneiras, o espanto da liderança liberal da Regência de Angra.
1832 - Mouzinho da Silveira |
A impressão foi tal que Mouzinho da Silveira, hoje homenageado como patrono da Escola Básica Integrada do Corvo, anos depois escreveria no seu testamento que gostaria de estar sepultado na ilha, "cercado de gente que na minha vida se atreveu a ser agradecida".
O decreto, datado de 14 de Maio de 1832, e assinado em Ponta Delgada por D. Pedro IV, reduziu à metade
(20 moios) o pagamento em trigo que os
corvinos faziam a Pedro José Caupers, então donatário da
Coroa, e eliminou o pagamento em dinheiro de 80 000 réis. Em contrapartida, a
Coroa assumiu indemnizar o donatário. O tributo apenas foi completamente abolido
em 1835.
O século XIX
No contexto da Guerra Civil Portuguesa (1828-1834), quando da ofensiva liberal do 7º conde de Vila Flor (1831), a ilha reconheceu espontaneamente o governo liberal. Pouco depois, Pedro IV de Portugal elevou a povoação do Corvo à categoria de vila e sede de concelho (20 de Junho de 1832). O decreto determinou que a nova vila se chamasse Vila do Corvo, e não Vila Nova como por vezes aparece grafado. Antes disso, esteve sob jurisdição de Santa Cruz das Flores, sendo uma das freguesias daquele concelho. Atualmente o dia 20 de Junho é feriado municipal.
Em 1886, o Governador Civil do Distrito da Horta, Manuel Francisco de Medeiros,
quando visitou a Vila do Corvo indagou quais eram as suas aspirações. Foi-lhe
pedido apenas uma Bandeira Nacional para saudar os barcos que por aqui
passavam.
Durante as suas expedições oceanográficas ao Atlântico, o príncipe Alberto I do Mónaco visitou
demoradamente a ilha no seu iate Hirondelle, recolhendo imagens
fotográficas de extraordinário interesse, hoje no Museu Aceanográfico do Mónaco e apenas parcialmente publicadas.
A ilha foi também visitada em 1934 pelo
escritor português Raul Brandão, que com a sua obra Ilhas Desconhecidas muito contribuiu para
a mitificação das vivências dos habitantes do Corvo, criando a imagem de uma
idílica república comunitária que persistiu até quase aos nossos dias.
A partir do início do século XIX assistiu-se ao crescimento constante
da emigração para os Estados Unidos e Canadá, com um interregno entre 1925 e 1955, num processo que se prolongou até meados da década de 1980.
Do século XX aos nossos dias
Em 1938 o Corvo teve pela primeira vez um
médico residente, o dr. João Rosdrigues Ferreira da Silva, que ali permaneceu até 1945. O actual centro de saúde da ilha ostenta o nome
daquele médico.
De 1950 a 1954, O Corvo teve um outro médico residente, Álvaro de Sousa e
Brito, que ali viveu com a sua mulher e duas filhas, uma das quais ali nasceu
com a assistência do seu próprio pai. O Dr. Álvaro de Sousa e Brito, para além
da sua actividade clínica onde de inclui a sua preciosa contribuição para
erradicar as epidemias de tifóide na ilha, também contribuiu juntamente com o
padre Leoneto Melo do Rego, para desenvolver a banda de música já existente. Para ajudar os rapazes da ilha a terem uma actividade
desportiva, iniciou a prática do voleibol.
Germinação com Turlock |
Vista aérea do Corvo (Aeródromo) |
Em 28 de Setembro de 1983, foi inaugurado o Aeródromo do Corvo, com uma pista de 800 metros de extensão. De início, as ligações aéreas
entre o Corvo e a Terceira (Lajes) eram asseguradas por um avião CASA C-212 Aviocar da Força Aérea Portuguesa. A
partir de 1991 esta aeronave foi substituída
por um Dornier 228-212 da SATA, fazendo as
ligações com Santa Cruz das Flores, Horta e Terceira (Lajes). O aeródromo é servido quatro dias por semana no período do Verão, e três dias por semana no de Inverno, podendo o número de voos ser
alterado se a quantidade de passageiros assim o demandar.
Vila do Corvo |
Vila do Corvo
A Vila do Corvo, também chamada erradamente de Vila Nova do
Corvo, é a mais pequena dos Açores, com 425 habitantes (em 2001). A única
povoação da ilha é constituída por um aglomerado de casas baixas com ruas
estreitas e tortuosas que sobem as encostas, conhecidas localmente por
canadas. Sofreu devido à emigração, principalmente para os EUA e Canadá..
A superfície do seu concelho corresponde a
toda a superfície da ilha. O concelho mais próximo é Santa Cruz das Flores, tornando este o local habitado mais isolado de Portugal.
Medalha da Ilha do Corvo (Caldeirão) |
Monumentos e museus
Do património arquitectónico existente, destaca-se a Igreja de Nossa Senhora doa Milagres, construída em 1795, que veio substituir a primitiva ermida. No seu
interior, podem admirar-se a estátua da padroeira, obra flamenga do século XVI da escola de
Malines, um Cristo em marfim e uma imagem em madeira de Nossa Senhora da
Conceição, entre várias outras imagens existentes na igreja.
Além da igreja, é digna de ser visitada a Casa do Espírito Santo, no
típico Largo do Outeiro, fundada a 1871,
seguindo a traça simétrica típica das Casas do Espírito Santo das ilhas das
Flores e Corvo.
Junto ao aeroporto existem os interessantes moinhos de vento típicos do
Corvo, classificados como imóveis de interesse municipal. Dos cerca de 7 moinhos que existiram na ilha, apenas 3 moinhos se
mantêm em funcionamento, embora já não sejam utilizados para o fim para que
foram construídos.
O casario da vila é um verdadeiro museu vivo, também classificado como
conjunto de interesse público, onde as pessoas mais antigas preservam no falar
expressões arcaicas únicas com uma evolução linguística muito própria.
Em duas casas tradicionais cuidadosamente recuperadas foi instalado em 2007 um moderno centro interpretativo cultural
e ambiental da ilha, com espaço museológico e galeria para exposições
temporárias.
Um local a não perder é o Miradouro do Pão de Açúcar localizado na elevação do Pão de Açúcar, infelizmente desfeiteado por uma lixeira a céu aberto. O troço
ascendente da estrada que conduz ao interior da ilha também proporciona vistas
de grande beleza sobre a vila, a fajã onde ela se situa e a vizinha ilha das Flores.
O Caldeirão, a cratera central da ilha, com as suas lagoas e turfeiras, é uma das mais belas
paisagens dos Açores. Foi ainda constituída ao abrigo da Directiva Habitats e da Directiva Aves o Sítio de Importância Comunitária Costa e Caldeirão do Corvo e
a Zona de Protecção Especial da Costa e Caldeirão, hoje integrados no
Parque Natural da Ilha do Corvo criado pelo Decreto Legislativo Regional nº. 56/2006/a, de 22 de Dezebro.
Sem comentários:
Enviar um comentário