quinta-feira, 21 de março de 2024

De Basalto e Mar (30.NOV.19)






Maria de Lurdes de Mendonça Ramos de Freitas

nasceu em Fevereiro de 1950, na localidade da Fazenda, concelho de Santa Cruz das Flores. Reside na ilha Terceira desde 1983.

Iniciou a sua vida profissional aos 19 anos e desempenhou diversos cargos de chefia administrativos na administração pública. Aposentada desde 2005, passou a dedicar-se ao coleccionismo e à escrita. Autora de imensos poemas, escritos ao longo da vida.



PREFÁCIO



Os poetas têm razões que a razão desconhece.
Profanadores de todos os saberes, eles sabem que as palavras se corrompem no comércio quotidiano das gentes. Por isso recuperam, transfiguram e subvertem essas palavras. Porque sabem que a poesia não explica, implica; o poema não afirma, sugere. O significado da imagem poética remete-nos sempre para um esfíngico segredo e para uma forte ambiguidade. Nesta perspectiva, a poesia será sempre uma tentativa de compreender o incompreensível.


Bilhete Postal Máximo
Ao leitor é lançado um desafio: o de descortinar o lado de lá da neblina do verso. Isto é, ele terá de ser capaz de decifrar e descodificar o(s) sentido(s) do poema, para que assim aconteça a fruição do texto. Ao poeta cumpre o ofício de lapidar a palavra exacta e essencial, e nela encontrar os ritmos e as pulsações, os silêncios e as sonoridades. Sendo um (incansável) trabalhador da palavra, ele não deixará nunca de observar e dissecar a sua vida (a sua alma) – como Vernet  agarrado ao mastro do navio para estudar a tempestade…
Selo comemorativo
Florentina de há muito radicada na ilha Terceira, Lurdes Freitas é uma “andarilha” contemplativa e impressionista que, qual outro Vernet, empreende neste livro de estreia poética, De basalto e mar (2019), uma viagem interior numa espécie de inquérito ao subconsciente. E, “alma divagante”, colhendo impressões do que vê, sente e pensa, ela procura na viagem não o destino, mas a sua própria natureza. Isto é: a viagem como forma de procura e de descoberta, sendo a errância a busca do sonho e da felicidade possível.
Livro de sonhos e memórias, de olhares e impressões, de entimentos, emoções e estados de alma, estamos perante uma poética da intimidade, da expressão lírica, com versos certeiros e harmoniosos, de boa ressonância musical.



Todas as ilustrações são do artista
Helder Tavares
          De resto, a poesia tem, na sua origem, uma vocação cantante. Foi assim com os Gregos. Foi assim com a poesia trovadoresca. E, nesta matéria, carradas de razão tem Paul Eluard: “A poesia é a linguagem que canta”.

Numa escrita insulada e telúrica, De basalto e mar é atravessado por três grandes linhas de força: a ilha (enquanto terra-mater insular), a solidão e o amor.

Espaço imagético e afectivo, a ilha, geradora de mitos, mistérios e fascínios, está sempre presente nos versos desta autora, que estabelece com a ilha uma identidade, uma identificação e uma comunhão. E, através do acto de nomeação, ela dá verdade e simbolismo poético à ilha: “mar”, “maré cheia”, “vazante”, “espuma”, “basalto”, “lava”, “cais”, “praia”, “búzios”, “conchas”, “nuvens”, “gaivota”, “garajau”, “ganhoa”… Todos estes elementos não estão aqui a servir de mero décor – funcionam como uma celebração poética da vida.

Carimbo comemorativo
Para além desta captação sensorial da ilha, há também um sopro de solidão, silêncio e saudade que atravessam as páginas deste livro. À solidão está associada o amor perante o qual o eu poético é um ser solitário. Buscando o inatingível e aspirando ao impossível estado de alma, a poeta idealiza o amor como um sentimento absoluto; depara, porém, com um amor perdido, sempre interiorizado e pressentido…
“À deriva” e a contas com a usura do tempo (cf. o poema “Eternidade”), o sujeito da enunciação fala-nos de uma inquietação metafísica e existencialista, de que é exemplo o poema “Dúvida” e que assim começa: “Hoje dei por mim a pensar/ se existo, como supunha,/ se estou no fim, no início,/ ou no meio de coisa nenhuma” (pág…..). Por outro lado, estamos perante um jogo de máscaras e espelhos em que se questiona o enigma, o mistério e as contradições da existência humana. (Cf. “Circo de fogo”, excelente poema).

De basalto e mar remete-nos para a consciência do próprio acto poético (cf. o poema “Ideal”) em que “Outono” rima com “abandono”, numa poética que dialoga com outros autores (Fernando Pessoa, António Aleixo, Vitorino Nemésio) e se confronta e defronta com as quotidianas vicissitudes do mundo – renúncia às verdades ilusórias, denúncia dos males que nos rodeiam (Cf. o “Poema a uma baleia que comia plástico”).
Bilhete Postal


São versos bem carpinteirados, forjados à luz do real e da fantasia, do vivido e do sentido. Gostei incondicionalmente desta poesia despojada, espontânea e emotiva, iluminada e fascinante, de grande serenidade, sem artifícios e sem desvios, com enorme poder de irradiação e encantamento. Apreciei, como acima referi, a incidência no elemento vocal e sonoro desta linguagem poética (sobretudo a musicalidade das sílabas tónicas). Acima de tudo encontrei, neste livro, o lado silencioso de Lurdes Freitas, que escreve com os cinco sentidos e com os olhos da memória.

Temos Poeta!



Victor Rui Dores




Bilhete Postal comemorativo

Rubricado por:

Dr. Victor Rui Dores - Que prefaciou e foi o apresentador
Sr. José Gaspar de Lima - Vice-presidente da CM de Angra do Heroísmo
Sr. Alcino Meneses - Presidente da Direcção da AHBV de Angra do Heroísmo
Sra. Maria de Lurdes Freitas - autora do livro
António Armindo Couto - Presidente da Direcção do NFAH

















02-02-2020 
(Sessão de Autógrafos)

















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