Baía da Praia da Vitória Ilha Terceira |
Um pirata na
Praia da Vitória
1862 - Navio Alabama |
Tudo
se passa durante a guerra da Secessão dos Estados Unidos da América. De modo a
evitar o bloqueio naval que o Norte impunha aos seus portos, a Confederação
resolveu adquirir uma frota de navios capazes de manter uma guerra de corso no
alto mar. Estas acções de autêntica pirataria tinham dois objectivos: um deles
era o de impedir a livre circulação da frota mercante da União, pelos mares de
todo o mundo e o outro seria o de levantar o bloqueio dos portos sulistas com o
afastamento das fragatas de guerra em perseguição dos navios corsários.
O Alabama era um destes navios de corso.
Com um casco de madeira de carvalho forrado a cobre - como protecção contra o
teredo - o navio estava aparelhado como uma barca de três mastros sendo
motorizado por duas turbinas a vapor capazes de o fazer singrar a cerca de 13
nós.
1903 - Vista da Vila da Praia e a sua baía |
Como
não podia, também oficialmente, construir navios de guerra para um dos
beligerantes, o Enrica fez a sua
primeira viagem de teste sob a capa de navio mercante. Em vez de regressar ao
estaleiro, o capitão do Enrica
desembarcou os passageiros da viagem inaugural nas margens do rio Mersey e seguiu
para o mar alto, em direcção à Praia da Vitória aonde arribou a 26 de Agosto de
1862.
Esta
ancoragem fora o toque final de uma manobra muito bem montada. Com efeito,
chegara ao mesmo porto no dia 10 do mesmo mês o vapor Barcelona; no dia 18, ancorara a barca Aggripina e, a 20 de Agosto, o vapor Bahama. Destes navios tinham desembarcado os oficiais e tripulantes
do navio que agora chegava. Entre os 120 membros da tripulação - na sua maior
parte ingleses, canadianos, alemães, galeses e até um português - encontravam-se
o comandante, capitão Raphael Semmes, de Maryland; o tenente Arthur Sinclair, o
médico Llewellyn e o imediato, o tenente John McIntosh Kell, da Georgia.
Sob
os protestos do Governador Civil, Jácome Bruges, o Enrica transfigura-se em C.S.S.
Alabama e navega para a Baía do Fanal.
E é nessa baía que, ao alcance da
artilharia da Fortaleza do Monte Brasil, a barca Aggripina procede ao transbordo de carga para o navio corsário:
carvão, munições e, muito especialmente, armamento.
Entre as seis bocas de fogo convencionais, de 32 libras , encontravam-se
duas armas da nova geração, de cano estriado e de disparo de obuses, que
constituíam a tecnologia de ponta da época. Uma delas, a Blakely de 110 libras , pode ser
vista na fotografia que enquadra este texto. Depois de recuperada do local do
naufrágio, verificou-se que continha um obus no seu interior e que este ainda
tinha pólvora excelente estado.
1907 - Mapa de Cherbourg |
Este
acto deu de que falar em Washington e, em represália, a Marinha nortista enviou
18 navios em perseguição do Alabama
que se dirigia a todo o vapor para o porto da Baía, no Brasil. Daqui parte em
seguida para a Cidade do Cabo, na África do Sul e, posteriormente, para
Singapura, afundando sempre todo e qualquer navio nortista que lhe passasse ao
alcance.
Em
1864, o Alabama deixou o Oceano
Índico e rumou em direcção à Europa de modo a poder sofrer uma reparação
exaustiva, na doca seca do porto de Cherbourg aonde chega a 11 de Junho. Três
dias mais tarde, chega à vista do porto francês o navio de guerra nortista U.S.S. Kearsage. Este navio, de 1030
toneladas, era comandado pelo capitão John Winslow que, ironicamente, fora
companheiro de quarto de Semmes aquando da guerra com o México.
O combate ao largo
de Cherbourg
1890 - Navio Kearsage |
Enquanto
que a tripulação do Alabama se
afadigava a polir os bronzes e a escovar o tombadilho, na antecipação do
combate, o Kearsage procedia à
armorização do seu casco, recorrendo ao uso de correntes de ferro que se
estendiam por todo o casco. Os jornais franceses divulgaram o combate iminente
e cerca de 15 mil espectadores afluíram à cidade, na expectativa de verem
sangue, morte e glória.
No
dia 19 de Junho, o Alabama deixa a
segurança do porto. Com ela navegam, à sua ilharga, uma fragata francesa,
inúmeros botes e caíques e uma embarcação que a bordo transportava o pintor
Édouard Manet que mais tarde pintaria a cena do combate.
1904 - Bilhete Postal comemorativo de agradecimento pelo refúgio do Alabama na Baía de Angra em 1862 |
O
combate começava, finalmente, a duas milhas da costa. Um dos obuses do Alabama destruiria os costados e parte
de tombadilho do Kearsage enquanto
que um dos tiros nortistas arrasava a casa do leme da embarcação corsária.
Quarenta e cinco minutos após o início da batalha, o Alabama ficava sem uma das máquinas de vapor.
Com
a água a entrar às golfadas no interior do casco, Semmes dá ordem para se
abandonar o navio. O comissário português ajuda o seu capitão, tirando-lhe as
botas, e morre posteriormente por não saber nadar. Ao todo morreram 9 homens na
batalha, 12 afogaram-se e 21 ficaram feridos. Semmes foi recolhido pelo iate do
empresário têxtil inglês, John Lancaster, e acabou os seus dias na Inglaterra.
Depois de 22 meses e de 64 afundamentos o Alabama afundava-se, a 60 metros de
profundidade, no Canal da Mancha.
O seu afundamento impressionou toda a Europa
e causou uma impressão profunda nos terceirenses.
Texto parcial do Dr. Álvaro Monjardino
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