Campo de
Aviação da Achada
Nos anos vinte do século passado aumentou consideravelmente a pressão sobre o governo Português para que fosse construída uma pista de aviação nos Açores.
De entre tais
vozes assume-se de extrema importância, pela pertinência e carácter quase
profético, um artigo a 30 de Julho de
1929, em Lisboa, no jornal “Século”, assinado por um açoriano, “F.
B.”, defendendo a construção de uma pista na Terceira, nos seguintes termos:
“Por todos os motivos, de lamentar que não se tenha dado execução (...) quase a
seguir são dois desastres de aviação estrangeiros, sem que no Arquipélago
houvesse os serviços de aviação necessários, para os evitar (...). Tenhamos por
assente que o futuro da Ilha Terceira está na Aviação”.
Realçando-se assim
que o pretexto maior para a construção de tal infraestrutura assentava na
necessidade de se precaver a recorrente ocorrência de acidentes.
Aos acidentes aéreos o
jornal A União, já a tal se referia
a 12 de Outubro de 1927, quando amarou a oeste da Ilha Terceira um monomotor
tripulado pelos americanos, Ruth Elder e George Haldeman, depois de trinta e
cinco horas de voo, com o objetivo de fazer a travessia Nova Iorque – Paris. Também
há referência ao acidente de um avião italiano, o “Santa Maria” que
amarou perto das Flores por falta de combustível, sendo rebocado por um navio
da mesma nacionalidade para a Horta, tendo
voado novamente para as Flores, rumando de seguida para Ponta Delgada a
10 de Junho de 1927 e no dia
seguinte chega a Lisboa. Este avião era tripulado pelos pilotos italianos
Pinedo, Carlo del Prete e Victale Zacchetti, pertencentes à aviação militar
italiana, e pretendiam fazer o reconhecimento da travessia do Atlântico Sul e
ligação Roma - Rio de Janeiro.
Já mais tardiamente, em 1929, ocorreu
o trágico acidente de um avião polaco tipo Amiot, no lugar de Vitória na Ilha
da Graciosa, cerca das dezanove horas de 13 de Julho de 1929 tendo falecido o
Major Piloto Idzikowskiew, com trinta
e seis anos de idade. O seu colega
aviador Kubala, foi salvo por um lavrador da
freguesia de Guadalupe, o senhor Jerónimo Correia Picanço, que o retirou dos escombros. Estes
aviadores tentavam atravessar o Atlântico.
Estes e outros
eventos, suportados por pressões da
sociedade terceirense, levaram a que o governo Português, considerasse a
viabilidade de se construir uma pista para a aviação numa das ilhas do
arquipélago.
Na mesma esteira o Tenente Coronel
Aviador Cifka Duarte elabora um
estudo em 1928 onde vem precisamente
defender a construção de um campo de aviação na Achada, entre a Serra do
Moirão e os terrenos dos Cinco Picos. Tal parecer não obteve, contudo, a opinião favorável do
Capitão da Aeronáutica Francisco Aragão que em gozo de férias na ilha de S.
Miguel, se deslocou à Ilha Terceira a fim de dar o seu parecer.
No entanto o diário terceirense “A União”, único
publicado na Ilha Terceira naquela época, continuou a bater-se incansavelmente para alertar a opinião
pública para a necessidade da construção de um campo de aviação nos Açores com artigos nos dias 18, 20 e 25 de
Julho de 1929 nos quais, para
além de pedir à Administração Geral dos
Correios “uns simples pedaços de ebonite” para que a Estação das Faleiras, na
Terra Chã, possa receber mensagens, inclusive de aviadores, questionava-se qual o local onde se poderia
“aterrissar” na Ilha Terceira, sendo sugerido que, para além do areal na Praia da
Vitória, haveria a planície da
Achada aonde a Junta Geral já mandou “limpar de pedras e balizar o campo da
Achada que ficará assim mais apto a ser utilizado por um avião como campo de
emergência.”.
Nos dias seguintes, na edição de 22 de Julho
de 1929 vem dar igualmente conta
das medidas do Campo de Aviação da Achada, referindo como tendo 600 metros de comprimento por 60 metros de
largura, podendo ser aumentado para 800 metros e “quando se tratar de uma
instalação definitiva, preparar-se para outra faixa de cerca de 1000 metros fazendo
em ângulo com a primeira”.
Será finalmente um mês depois da publicação do artigo no jornal “A União”,
de 18 de Julho de 1929, defendendo como muito importante a construção de um
“campo provisório e esse será indicado com a aprovação dos nossos aviadores”, que se anunciará que a Junta Geral irá
iniciar as obras de terraplanagem “em faixa de terreno nos baldios dos
Borratéus, junto à Estrada da Achada”.
Era então Presidente da Comissão Administrativa
da Junta Geral do Distrito Autónomo de Angra do Heroísmo o Dr. Manuel de Sousa
Menezes, cirurgião e capitão-médico, sendo vice-presidente o Dr. Constantino Menezes
Cardoso os quais se debateram arduamente para que fosse construída a pista de
aviação da Achada, tendo aprovado em 8 de agosto de 1929, com recurso às verbas
da viação, o dispêndio de cinquenta mil escudos nas obras do campo de aviação
da Achada.
A Junta Geral e a sua Comissão Administrativa,
acreditaram na construção da pista quando receberam um telegrama do Ministro do
Interior, para no prazo de trinta dias mandar desfazer as curvas perigosas e
tapar rodeiros na “Estrada de Angra-Achada-Praia”.
Na ata de 15 de Agosto de 1929, a Comissão
Administrativa da Junta Geral de Angra do Heroísmo, aquando da decisão para a compra dos terrenos para o aumento do
campo da aviação, delibera o seguinte: “(…) quanto vantajosa é a construção de
um campo de Aviação para esta terra que infelizmente vem vivendo em regime
deficitário, necessitando por todas as formas, promover o seu enriquecimento e
ponderando ainda quanto tal empreendimento tem de utilidade nacional, dada a
necessidade internacionalmente reconhecida de um campo de Aviação nos Açores”,
demonstrando que a Junta Geral
reconheceu como sendo de enorme importância apoiar este projeto.
Para tal realizará
todos os esforços para o efetivar,
em prejuízo das verbas dedicadas ao
cuidado das estradas do Distrito de Angra do Heroísmo que incluía, além da Ilha
Terceira, as ilhas Graciosa e S. Jorge.
Como os
baldios dos Borratéus, não eram suficientes para o Campo de Aviação o doutor
Constantino Menezes Cardoso, procurou o Tenente-coronel
Francisco de Paula Rego, procurador do proprietário dos pastos contíguos a
nascente dos baldios, os quais mediram
aproximadamente e propuseram à
Comissão Administrativa da Junta Geral na reunião de 15 de agosto o seu arrendamento ou aquisição, tendo sido adotada a compra dos
mesmos, para se conseguir “um campo de aviação definitivo com esplêndidas
dimensões”.
Em medidas aproximadas de 2323,20 ares a
quinhentos escudos por cada nove ares e oito centiares ou sejam cerca de 128 mil escudos, as quais seriam mais
exatas em medição a realizar
antes da compra.
O
chefe da Secretaria foi então mandatado
para realizar a escritura com
isenção de sisa, dada a urgência em obter a área necessária para o campo de
aviação.
Contudo, era do entendimento da Junta Geral que a despesa com o
Campo de Aviação da Achada, dado o interesse nacional e internacional como ficou lavrado em ata da
reunião acima citada, fosse da responsabilidade do Governo Central.
A tudo isto acresciam igualmente as dificuldades
iniciais de mão de obra pelo que pela ajuda prestada para continuação dos
trabalhos, a Comissão
Administrativa da Junta Geral de Angra do Heroísmo na reunião de 5 Setembro
aprovou um agradecimento ao Governador
Militar dos Açores, Coronel
Pedro Paula Pinheiro Machado por “ter acedido da melhor boa vontade à solicitação, por esta Comissão feita, de
dispensar as praças da guarnição que as exigências do serviço militar
permitissem para se ocuparem no serviço de coadjuvação das obras de adaptação
do terreno da Achada, para ali ser estabelecido um campo de aviação”.
A referida Comissão deliberou igualmente em 2 de novembro de 1929 permitir à Junta Geral de
Angra do Heroísmo que “os terrenos
da Achada concedidos ao Ministério da Agricultura por escritura de 11 de Agosto
de 1920, para estabelecimento de um posto zootécnico sejam aproveitados na
construção de um campo de aeronaves”, podendo a Junta Geral dispor
dos mesmos terrenos para entrega ao Estado, à Arma da Aeronáutica ou a outra
entidade, revertendo para a Câmara Municipal a propriedade quando os terrenos
deixarem de ter o destino de Campo de Aviação. Esta informação é crucial para
explicar o fato de esses terrenos serem hoje a Estação Experimental do
Departamento de Ciências Agrárias da Universidade dos Açores.
Assim, finalmente, em
Setembro de 1930 chegou à Ilha Terceira,
no navio “Lima”, vindo de Lisboa, o Tenente Coronel Piloto Aviador Cifka
Duarte, inspetor da Arma da Aeronáutica e pioneiro da Força Aérea Portuguesa bem como Major Pil. Av. Ribeiro da
Fonseca e o Capitão Pil. Av. Frederico Coelho de Melo, este natural da freguesia dos Altares, na Ilha Terceira, onde nasceu a 25
de Abril de 1895, para no local se inteirarem dos trabalhos no “Campo de
Aviação da Achada”. No mesmo navio vinha um avião monomotor Avro 504K,
biplano, que serviu ao Capitão Piloto Aviador Frederico C. de Melo, para
realizar descolagens e aterragens de teste na nova pista de terra batida.
Esta aeronave tinha como
origem a compra que Portugal realizou à Grã-Bretanha 30 aviões Avro 504 K, a 10 de Novembro de 1923, tendo
sido feita a entrega a 20 de Maio de 1924. Além dos três cedidos para a
Aviação Naval, todos eles foram usados para instrução de pilotos na Escola
Militar de Aeronáutica em Sintra. Estes aviões que foram dos mais importantes
usados pela Grã-Bretanha durante a I Guerra Mundial, foram construídos pela A.
V. Roe & Co. Ltd e tinham de comprimento 8,91 metros, de envergadura
de 10,97 metros e de altura 3,15 metros e eram propulsionados por um motor Le
Rhône R-9-J de 9 cilindros radiais rotativos, debitando 110 hp.
Finalmente a inauguração a 4 de Outubro de 1930.
Nesse dia o povo ocorreu à Achada para assistir à inauguração do
Campo de Aviação, com seiscentos metros de comprimento e 70 metros de largura,
o qual foi benzido, como também o avião, pelo Bispo dos Açores D. Guilherme
Guimarães, acompanhado pelo Vigário-Geral Dr. Almada.
A inauguração do Campo da Achada aguardava uma previsão meteorológica que permitisse um bom dia de sol o que veio a acontecer nesse 4 de Outubro de 1930, um sábado.
Segundo o jornal
“A União”, tal contribuiu para que uma multidão de milhares de pessoas, a
maioria a pé, se deslocasse para a Achada a fim de, pela primeira vez, verem
uma aeronave levantar voo e voar à volta da Ilha Terceira, como também efetuar
voo baixo que, como se pode facilmente adivinhar, surpreendeu imenso os
espectadores. Se, e embora, a 13
de Outubro de 1924, dois dirigíveis Zeppelin com 200 metros de comprimento por
28 de largura tivessem já sobrevoado
Angra do Heroísmo o que foi uma enorme surpresa para a população terceirense,
mas ver uma aeronave levantar de terra e sobrevoar a ilha voltando a aterrar no
mesmo sítio foi um espetáculo que deve ter perdurado na memória de todos
quantos o presenciaram.
Dirigível Zeppelin voando a 13 de Outubro de 1924 sobre Angra do Heroísmo
na sua viagem da Alemanha para os Estados Unidos.
Os convidados oficiais foram recebidos pelo Dr. Manuel de
Sousa Menezes, cirurgião e capitão-médico, na sua condição de Presidente da
Comissão Administrativa da Junta Geral de Angra do Heroísmo, para uma tenda
colocada junto ao hangar construído perto da Estrada da Achada, em meados de
setembro, logo após da vinda do Capitão Piloto Aviador Frederico Coelho de
Melo. O resto da multidão foi disposta ao longo da estrada e no Pico do Ginjal,
a mando dos soldados do exército sob as ordens do Major José Agostinho, Diretor
do campo de aviação.
Antes do meio dia procedeu-se à bênção da aeronave “Açor”
pelo bispo da diocese D. Guilherme Augusto da Cunha Guimarães de mitra e capa
de asperges, acompanhado pelo vigário geral dr. Almada e o mestre de cerimónias
padre Marques como também pelos sacerdotes que acorreram ao evento.
A menina Maria Cristina filha do Major José Agostinho, Diretor do Campo de Aviação da Achada, quebra uma taça de champagne no Avro 504 durante a cerimónia de batismo com o dr. Manuel de Sousa Meneses, fardado de capitão-médico, observando à esquerda da fotografia.
Autoridades militares, religiosas e civis na cerimónia de batismo d “Açor” estando na primeira fila o Capitão-piloto-aviador Frederico de Melo e o Major José Agostinho que observa a fila Maria Cristina com um ramo de flores que irá entregar a Frederico de Melo.
Depois da Banda Regimental ter tocado, ocorreu ao local “a menina Maria Cristina, gentil filha do ilustre Diretor do Campo sr. Major José Agostinho que quebra uma taça de champagne, em frente do Avro, e oferece ao distinto aviador um lindo bouquet de flores naturais”, tal como foi relatado num artigo de primeira página a quatro colunas no jornal “A União” de 7 de Outubro de 1930.
O dr. Manuel Sousa Menezes, fardado de militar, dirigiu-se aos presentes para os saudar e agradecer a todos quantos contribuíram para que o campo de aviação fosse construído, referindo expressamente o Governo Militar dos Açores e ao Delegado do Governo, “quando se tratou do concurso de adjudicação das linhas aéreas nacionais, para a valorização nosso campo”, o que não veio a acontecer por o Governo Central ter optado por outra solução. Como consequência desse facto e por não ter havido procura de aeronaves para aterrarem de emergência no Campo da Achada que se queria que fosse o “Campo de Aviação da Terceira”, a Junta Geral optaria posteriormente por parar o investimento na melhoria e aumento do campo de aviação até que houvesse empenho orçamentado do governo central.
O avião utilizado, o Avro
504K, foi batizado como “Açor” no ato da sua bênção.
Este avião Açor, percursor da aviação militar na Ilha Terceira e o primeiro a agora a levantar e aterrar em pista em terra exibiu para o efeito fuselagem e asas pintadas de alumínio e toda a secção do motor a preto, e apresentava a Cruz de Cristo, sobre círculo branco, nos extremos exteriores das asas superiores e inferiores e a bandeira nacional com escudo cobrindo todo o leme de direção, além do nome e de um açor estilizado pintado a preto nos lados da fuselagem, concebido pelo artista terceirense Maduro Dias.
Ao
meio dia o Avro “Açor” foi levado para o centro do campo e o mecânico deu uma
volta à hélice para iniciar o motor, para depois “abandonado à direção hábil do
seu afamado piloto, desliza suavemente sobre a relva, e, em menos de cinquenta
metros já estava suspenso nas suas asas” para atingir a altitude de seiscentos
metros, no dizer do articulista do jornal acima citado, “atingida essa
altitude, o arrojado piloto, que é um exímio acrobata de fama internacional,
aproa o aparelho na vertical ascendente e volta-o sobre si mesmo num arriscado
looping”.
Depois
de uma série de manobras, incluindo uma passagem de baixa altitude para saudar
os espectadores, bem como algumas
evoluções no ar para gáudio dos presentes e sobrevoado a ilha distribuindo
panfletos alusivos ao ato, o piloto Frederico de Melo aproxima-se pelo
ocidente do campo e vem parar junto do público aonde é bastante aplaudido e
abraçado.
À
noite houve uma sessão solene no Teatro Angrense de homenagem a Frederico
Coelho de Melo onde discursou o jornalista Miguel Forjaz que frisou a
importância do acontecimento.
Estava
inaugurado este Campo de Aviação, o primeiro, feito em terrenos públicos e
privados da Achada com grande esforço económico da Junta Geral de Angra do
Heroísmo em prejuízo de investimentos na sua rede de estradas não só na Ilha
Terceira como nas Ilhas de S. Jorge e Graciosa e fruto de continuas pressões da comunidade.
Em
1941 foi novamente usado para acomodar os nove aviões biplanos Glocester
Gladiator em virtude de o campo de aviação nas Lajes ainda não estar em
condições de os receber.
Capitão Frederico de Melo e a sua Senhora
O governo português através do Comando Geral da
Aeronáutica Militar, pertencente ao Exército, preparava-se para instalar meios
militares aéreos no arquipélago, tendo sido emitido uma ordem que incumbiu, em
Maio de 1941, a Base Aérea n.º 3 em Tancos e a Base Aérea n.º 2 na Ota de
organizarem duas Esquadrilhas Expedicionárias de Caça equipadas com aviões
Gloster Gladiator, as quais tomaram os números 1 e 2,
respetivamente.
Nos Açores a Engenharia Militar já tinha iniciado a terraplanagem dos novos aeródromos, um em Santana, S. Miguel e o outro nas Lajes, Ilha Terceira, sobre as ordens do “Alto Comando Militar dos Açores” localizado em Ponta Delgada na Ilha de São Miguel, este Alto Comando compunha um Comando de Aeronáutica e um Comando Marítimo de Defesa.
Os Gloster Gladiator MkII foram adquiridos pela Aeronáutica Militar em Setembro de 1938, tendo sido entregues nesta data os primeiros quinze e em Outubro de 1939 os últimos, de uma remessa de 30 aviões de caça, fornecidos pela Grã-Bretanha, e entregues nas Oficinas Gerais de Material de Tejo, o navio Mirandela zarpou para os Açores na noite de 4 de Junho de 1941, depois de visitado por um emissário do Ministério da Guerra, levando a bordo as Esquadrilhas Expedicionárias de Caça, totalmente equipadas, incluindo os aviões “Gladiators” encaixotados, chegando a Ponta Delgada, S. Miguel, a 8 de Junho. Depois de a Esquadrilha de Caça nº 1, destinada ao Campo de Santana em Rabo do Peixe, ter desembarcado, o navio partiu para Angra do Heroísmo onde chegou na manhã do dia 12 de Junho. Após a receção feita pelo Comandante Militar da Ilha Terceira e pelo Comandante Naval, a Esquadrilha de Caça nº 2 comandada pelo Tenente Machado Barros, desfilou pelo centro da cidade de Angra do Heroísmo, com pompa e circunstância, dirigindo-se ao Regimento de Infantaria nº 17, no Castelo de S. João Baptista, onde aquartelou por uma semana.
O material foi transportado por carros de bois e por um camião, este vindo de Lisboa, que carregaram os nove aviões “Gladiator” e mais material para as Lajes, onde a equipa de engenharia militar a cargo do Capitão Romão concluía uma faixa de terraplanagem para permitir a atividade dos aviões. Enquanto não terminavam as obras de expansão do Campo de Aviação nas Lajes os Glocester Gladiators tiveram que ficar no Campo de Aviação da Achada sob a guarda do cabo-piloto Carpinteiro. Depois desta função o Campo da Achada ficou sem outra utilidade relacionada com a aviação. O que foi ditando a sua lenta morte, através de sucessivos parcelamentos, que inevitavelmente levaram ao esquecimento da sua própria localização exata.
A localização exata do campo ter-se-á perdido, face à
inexistência, após aturadas pesquisas e dos quais não fomos os pioneiros, dos
documentos que documentassem, como mapa, as suas dimensões exatas. Contudo
estamos em condições de identificar claramente a sua localização original, bem
como da sua pista. Teremos, contudo, de deixar alerta para o facto de que, se
de início, foram sendo acrescentados terrenos até se atingir a sua máxima área,
depois, em fase de declínio marcado pela construção da pista das Lajes, foram
sendo, sucessivamente, desafetadas partes do mesmo. Por isso, algumas
referências tardias, já na segunda metade do seculo XX, podem induzir em erro
quanto à sua original localização, pois trata-se apenas de resquícios da
grandeza de outrora.
Assim, pela ausência de um mapa com a localização exata
do campo de aviação socorremo-nos das fotografias para, através de uma triangulação entre a aeronave
“Açor” e as montanhas representadas, se obtivesse no local a localização do lugar aonde a aeronave foi apresentada
ao publico. Foi assim concluído que a mesma estacionou na confluência da Canada
do Ginjal com a Estrada da Achada. Seria o então denominado o “largo do campo”.
Também há
referência no Jornal a União para que no dia da inauguração do campo com o primeiro
voo, os visitantes usassem-se essa canada para se dirigirem ao Pico do Ginjal
para assim verem melhor as manobras do voo.
As referências montanhosas utilizadas foram a ponta Este da Serra do Morião, o Pico do Ginjal e o Pico do Areeiro a partir de três fotografias com o Avro 504 “Açor” em primeiro plano.
Localização do Campo de Aviação da Achada.
A partir das atas da Junta Geral dos Registos Prediais e
da observação no terreno, concluímos também que o campo se estendeu da Canada
do Ginjal até perto do início da Zona Industrial de Angra do Heroísmo e da
Estrada da Achada até ao Pico Areeiro como está referenciado nas imagens que
acompanham este artigo, onde atualmente, em parte desta área, se situa a
Estação Experimental do Departamento de Ciências Agrárias da Universidade dos
Açores. Seria nesta estação
que ficaria a pista, de 600 metros de localização, reforçada a convicção
inicial com o facto de existir uma parcela de terreno que, em terreno plano,
mantem tal distância exata entre extremos (figura
1).
No “The American Foreign Service Journal” Vol. VII, Nº 7 de Julho de 1930, publicado em Washington D.C. o cônsul dos Estados Unidos da América, na Ilha de S. Miguel, Açores, William H. Hunt, escreveu que numa investigação feita por ele, o Campo de Aviação da Achada na Ilha Terceira tem a forma de um V, cobre uma área de 118 acres e que o custo total, incluindo a compra dos terrenos, foi de 98 000 dólares. Também informou que os soldados da guarnição do exército em Angra trabalharam no nivelamento de terreno.
Ao consultar o processo da Arma da Aeronáutica no Arquivo Histórico Militar no Museu do Exército verificamos que faltavam documentos cruciais para a história do campo da aviação e suas características, denominado de Processo do Campo da Achada os quais, conforme anotação nos referidos arquivos, foram entregues em 1932 ou 1933 ao Tenente-Coronel Brito Pais, o qual era inspetor da aviação, sendo ele que em 1924, como Comandante do avião Pátria, que fez o Raid Aéreo Lisboa-Macau. Por ter falecido precocemente em 1934 tais documentos nunca foram devolvidos. Após pesquisas em diversos arquivos não nos foi possível a sua recuperação, antevendo-se a sua eventual perda permanente, visto não fazer parte do restante espólio doado.
Em 2020 fará 90 anos
que o Campo da Achada foi inaugurado e
seria justo que houvesse uma homenagem com um memorial a colocar no local e
sugerimos o início da atual Canada do Ginjal, para que não se caia no
esquecimento o esforço de todos os que lutaram para que o primeiro aeroporto
fosse feito na Ilha Terceira e na planície da Achada.
Recordemos e saibamos honrar a frase de 1929 que presidiu
não só à construção do campo de Aviação da Achada, que reconhecendo a
importância estratégica de tal
caminho, adivinhou igualmente as consequências económicas, sociais e políticas,
que daí adviriam não só da Ilha Terceira, não só para os Açores, mas de toda
uma civilização Ocidental.
“Tenhamos por assente que o futuro da Ilha Terceira está
na Aviação”.
Deverá ser esta frase
a inscrever num urgente monumento que toda a comunidade lhe terá que erguer,
norteando o verdadeiro sentido da homenagem que se fará ao Campo de Aviação da
Achada.
Pedro Horta, Capitão da Força Aérea Portuguesa.
Fontes documentais:
-
Atas da Comissão Administrativa da Junta Geral de Angra do Heroísmo.
-
Jornal “A União” de 1929 e 1930.
- Documentos da Arma de Aeronáutica do Exército
Português no Arquivo Histórico
Militar, Caixa 796.
- “Aeronaves Militares Portuguesas no Século XX”,
Adelino Cardoso.
- “The American Foreign
Service Journal” Vol. VII, Nº 7 de
Julho de 1930, publicado mensalmente em Washington D.C.
- Arquivo fotográfico da Direção Regional de
Cultura/Museu de Angra do Heroísmo.
- Gabinete de Desenho da Câmara Municipal de Angra do
Heroísmo.
ÁLBUM FOTOGRÁFICO DO EVENTO
Clique aqui -> "O VOO DO AÇOR"
Sem comentários:
Enviar um comentário