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sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Gungunhana - o "Leão de Gaza" (1850-1906)

1895 - Gungunhana, rei de Gaza (Moçambique)
Gungunhana, rei de Gaza no sul de Moçambique, foi um grande resistente à penetração dos portugueses naquele território.




Mouzinho de Albuquerque
Acabou por ser derrotado por Mouzinho de Albuquerque, em 1895, e transferido para Lisboa na companhia de outros prisioneiros. Depois de permanecerem algum tempo em Lisboa, foi decidido encaminhar quatro deles para a Terceira: o filho Godide, o tio Molungo e Matibejana, vulgo Zixaxa.

Como não era permitida a poligamia, as sete mulheres de Gungunhana e as três de Zixaxa foram para Cabo Verde.

A 27 de Junho de 1896, chegaram a Angra do Heroísmo. Uma vez mais foram aguardados por numerosa multidão que os acompanhou ao Castelo de S. João Baptista. A imprensa local deu grande cobertura ao acontecimento e marcou o tom da relação a estabelecer com os prisioneiros:


"Respeitemo-lo pois, e que se lhes amenize, quanto possível for, a tristeza de exílio".


Com o decorrer dos tempos, as medidas de segurança foram-se simplificando e os prisioneiros podiam passear à vontade pelo Monte Brasil e depois pela cidade. Os moçambicanos começaram, então, a relacionar-se com os terceirenses. E um jornal local tudo relatava: "Todas as manhãs, com um pincel de nervura de palmeira, na dimensão de dez centímetros, esfregavam os dentes no sentido vertical e enchiam a boca de água para a devida lavagem - projetando-a fora, em seguida, a jeito de esguicho, a ir cair à distância de vários metros. Procediam, ainda, numa operação que durava cerca de vinte minutos, à limpeza da língua, com uma espátula de cana".



Na cidade de Angra, foi moda durante algum tempo o chapéu com abas à Gungunhana, que as meninas usavam; no Teatro Angrense, foi representada uma opereta intitulada " Gungunhana nos Açores", escrita por um terceirense; um artista de circo ofereceu-lhes um espetáculo privado e especial com números do seu burro sábio. 

Em 1899, foram batizados e crismados, na Sé de Angra, em cerimónia revestida da maior solenidade e muito concorrida. Apadrinhados pela alta sociedade angrense, que se esforçou por lhes dar o estatuto de assimilados, passaram então a chamar-se: Reinaldo Frederico Gungunhana, António da Silva Pratas Godide, Roberto Frederico Zixaxa e José Frederico Molungo.


Foto da Fábrica de Tabaco
"Flor d'Angra"
(coleção particular)


Em 1906, morreu Gungunhana com hemorragia cerebral, seguiu-se Godide em 1911 e o tio Molungo, um ano depois. Zixaxa ficou sozinho, com a profissão de guarda do Monte Brasil, até falecer em 1927, tendo deixado descendentes que ainda hoje vivem em Angra.

Carlos Enes in: RTP Açores




Gungunhana, o "Leão de Gaza"

Ngungunhane ou Gungunhana como era conhecido pelos portugueses, nasceu cerca de 1850 no Império de Gaza, em Moçambique. O seu avô Sochangane (Manukuse) fizera a ocupação de um vasto território entre o rio Incomáti e a margem esquerda do Zambeze e do Oceano Índico até ao curso superior do rio Save, controlando uma população de mais de 500.000 habitantes.

Pertencia aos nguni (vátuas), um dos ramos dos zulus, tendo a sua aldeia sagrada em Chaimite. A chegada dos nguni a esses territórios foi acompanhada do domínio de outros povos que já lá existiam, como os chopes, os tsongas, os vandaus e os bitongas. Depois da morte de Manukuse (1858), a guerra civil que opôs os dois herdeiros é ganha, com o apoio de autoridades portuguesas, pelo pai de Ngungunhane, Muzila. A sua sucessão, em 1884, foi igualmente problemática, conseguindo ascender ao poder Mudungazi (que mudou o nome para Ngungunhane), conhecido como o 'Leão de Gaza', que seria o senhor do segundo maior império de África no século XIX.

A localização deste império tornava-o apetecível para as potências coloniais, regionais e para as companhias coloniais. Ngungunhane sobe ao poder na conjuntura da Conferência de Berlim e do renovado interesse das potências pelo continente africano. Portugal busca nessa época consolidar a sua precária ocupação colonial, nomeadamente em Moçambique, assinando para tal um tratado de amizade e vassalagem com Ngungunhane, em 1885.



Aproveitando as rivalidades das potências europeias, Ngungunhane procura simultaneamente o apoio inglês. Na redifinição dos territórios africanos depois do Ultimatum, grande parte do império de Gaza fica no território de Moçambique. Em Agosto de 1894, os tsongas revoltam-se contra a autoridade colonial e colocam-se sob a protecção de Ngungunhane. Este recusa-se a entregar os chefes rebeldes aos portugueses, o que implicaria a sua submissão.

 

1895 - Captura de Gungunhana em Chaimite,
por Mouzinho de Albuquerque


Em 1895, tropas e colonos portugueses, sob a direcção do Comissário Régio António Enes, envolvem-se em confrontos com os ngunis, que se saldam numa sangrenta derrota destes últimos. Depois da derrota de Coolela, a 7 de Novembro de 1895, e de Mandlakasi, a 11 de Novembro, Ngungunhane refugia-se na aldeia sagrada de Chaimite. O major de cavalaria Mouzinho de Albuquerque, recém nomeado governador do distrito militar de Gaza, dirige a sua coluna para Chaimite, aprisionando Ngungunhane. No entanto, nem mesmo esta vitória da autoridade colonial fez cessar a resistência em Gaza. A repressão portuguesa é duríssima. 

Gungunhana e as suas sete mulheres

Em 1896 Ngungunhane, com algumas das suas mulheres e um filho, um tio e dois régulos, chega a Lisboa, onde é exposto à curiosidade popular. Atravessam Lisboa numa jaula, ficando em exibição no Jardim Botânico de Belém. 


No Castelo de São João Batista em Angra
Bilhete Postal (coleção particular)

Em Junho de 1896 foram enviados para a ilha Terceira nos Açores. Ngungunhane viveria onze anos no cativeiro açoriano, no forte de S. João Baptista. Tornado curiosidade local, é-lhe permitido caçar, faz cestos e aprende a ler e a escrever. É baptizado com o nome de Reinaldo Frederico Gungunhana.

Em Angra com os seus nomes de batismo
Bilhete Postal (coleção particular)
 



Morreu a 23 de Dezembro de 1906, 'batizado, alfabetizado e alcólico' (PÉLISSIER, René). Mas só morrerá cinco anos depois do suicídio de Mouzinho de Albuquerque.


Foto da Fábrica de Tabaco
"Flor d'Angra"
(coleção particular)

Em 15 de Junho de 1985, por ocasião do décimo aniversário da independência de Moçambique, os restos mortais do antigo imperador de Gaza são entregues pelas autoridades portuguesas ao novo país africano, que organiza as exéquias solenes devidas ao seu herói nacional.


In: Fundação Mário Soares






Há 124 anos, são instalados, na fortaleza de São João Baptista os régulos do país de Gaza, presos por Mouzinho de Albuquerque.

A bordo da canhoneira «Zambeze» da nossa marinha de guerra, comandante Fronteira Cáceres, chegaram à baía de Angra os quatro prisioneiros de guerra, régulos do país de Gaza – o Gungunhana, o Molungo, o Zixaxa e o Godide – que foram conduzidos ao castelo de São João Baptista sob o comando do general visconde de Vila Nova de Ourém que recomendou rigorosa vigilância para a conveniente segurança dos presos, sem constrangimento para sua situação, dando-lhes por homenagem o recinto da praça, advertindo a guarnição e habitantes do Castelo para que usassem das considerações devidas a prisioneiros de guerra.

Em Monsanto ficaram as dez mulheres dos prisioneiros e o Gó, o garoto cozinheiro.

Os quatro pretos, com homenagem na praça, estavam, durante o dia na caserna da 2.ª companhia do 2.º batalhão, sendo transferidos, de noite, para o calabouço junto à guarda do Paiol. As refeições iam tomá-las ao refeitório dos sargentos, às horas da comida dos oficiais inferiores.

«Imaginai quão grande desdita feriu esses filhos livres da Natureza, e que grande desalento lhes apertará o coração, vendo-se assim privados de tudo que mais amaram na vida: pátria, tesouros, mulheres ».

Sobreviveu a todos o Zixaxa, cujo porte era o mais distinto, manifestando astúcia ou inteligência superior aos demais, chegando a falar corretamente o português. Dele ficou um filho, nascido na cidade de Angra, e que se entrega à arte de marcenaria.

In Gervásio Lima, Breviário Açoreano, p. 205, Angra do Heroísmo, Tip. Editora Andrade, 1935.







Na sequência dos eventos realizados intitulados “Relembrando Gungunhana e seus companheiros de exílio”, em junho de 2019, o Município de Angra do Heroísmo encomendou ao escultor Julian Voss-Andreae uma obra com o busto de Gungunhana, personalidade escolhida para homenagear os presos políticos, desterrados, deportados, exilados, refugiados e emigrados forçados que ao longo dos tempos viveram entre nós, nomeadamente:
- Gungunhana (Império de Gaza, c. 1850 — Angra do Heroísmo, 23 de dezembro de 1906)
desterrado nesta cidade de 27 de junho de 1896 até falecer
- Judeus expulsos do reino de Portugal (séculos XV e XVI)
- D. Afonso VI, rei de Portugal (1669 – 1674)
- Deportados da Amazona (1810 – 1828)
- Emigrados liberais (1828 – 1830)
- Refugiados militares espanhóis (1867 – 1868)
- Depósito de Concentrados Alemães (1916 – 1919)
- Membros da Legião Vermelha (1925)
- Desterrados e presos políticos da ditadura militar e do Estado Novo (1926 – 1974)
- Marechal Gomes da Costa - líder militar do Golpe de 28 de maio de 1926 (1926 – 1927)
- Vice-almirante Luís da Câmara Leme senador da Primeira República (falecido nesta cidade em 1928)
- Bento Gonçalves secretário-geral do Partido Comunista Português (1930 – 1931)
- João Soares político da Primeira República e antifascista (1933)
- Acácio Tomás de Aquino dirigente anarco-sindicalista (1934 – 1936)
- Mário Castelhano militante anarco-sindicalista (1934 – 1936)
- Francisco Lyon de Castro editor e militante antifascista (1936 – 1940)
- Aos civis e militares que nesta cidade participaram na Revolta das Ilhas e que de 7 a 17 de abril de 1931 nela mantiveram viva a resistência à ditadura militar instalada a 28 de maio de 1926
- Em memória do Regimento de Infantaria n.º 22 e da Bataria de Defesa Móvel de Costa n.º 1, unidades militares extintas pelo Decreto n.º 19657, de 28 de abril de 1931
… e muitas e muitos outros que não podem ser esquecidos.




Julian Voss-Andreae escultor de origem alemã vive atualmente em Portland, no Oregon, com formação em física quântica e filosofia pelas Universidades de Berlim, Edimburgo e Viena, o seu trabalho é conhecido a nível mundial por misturar escultura figurativa com os conhecimentos científicos sobre a natureza da realidade, caracterizada pela sua experiência em diversos campos da ciência a uma profunda paixão pelos mistérios da física quântica têm sido uma fonte contínua de inspiração para o seu trabalho.
As suas obras são frequentemente exibidas em feitas e galerias de arte internacionais e podem ser encontradas em grandes coleções por todo o mundo.

(Julian Voss-Andreae)










































































     




Mia Couto, pseudónimo de António Emílio Leite Couto (Beira, 5 de Julho de 1955), é um biólogo e escritor moçambicano.
Mia nasceu e foi escolarizado na Beira. Adotou o nome porque tinha uma paixão por gatos e porque o seu irmão não sabia pronunciar o nome dele.


Com catorze anos de idade, teve alguns poemas publicados no jornal Notícias da Beira e três anos depois, em 1971, mudou-se para a cidade capital de Lourenço Marques (agora Maputo). Iniciou os estudos universitários em medicina, mas abandonou esta área no princípio do terceiro ano, passando a exercer a profissão de jornalista depois do 25 de Abril de 1974.





Foi nomeado diretor da Agência de Informação de Moçambique (AIM) e formou ligações de correspondentes entre as províncias moçambicanas durante o tempo da guerra de libertação. A seguir trabalhou como diretor da revista Tempo até 1981 e continuou a carreira no jornal Notícias até 1985. Em 1983, publicou o seu primeiro livro de poesia, Raiz de Orvalho, que inclui poemas contra a propaganda marxista militante. Dois anos depois, demitiu-se da posição de diretor para continuar os estudos universitários na área de biologia.

Além de considerado um dos escritores mais importantes de Moçambique, é o escritor moçambicano mais traduzido. Em muitas das suas obras, Mia Couto tenta recriar a língua portuguesa com uma influência moçambicana, utilizando o léxico de várias regiões do país e produzindo um novo modelo de narrativa africana. Terra Sonâmbula, o seu primeiro romance, publicado em 1992, ganhou o Prémio Nacional de Ficção da Associação dos Escritores Moçambicanos em 1995 e foi considerado um dos dez melhores livros africanos do século XX por um júri criado pela Feira do Livro do Zimbabué.




Foi fundador de uma empresa de estudos ambientais da qual é colaborador.

Em 2013 foi homenageado com o Prémio Camões, que lhe foi entregue a 10 de Junho no Palácio de Queluz pelas mãos do presidente de Portugal Cavaco Silva e da presidente do Brasil, Dilma Rousseff.







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